segunda-feira, 21 de julho de 2014

Sobre um domingo


Querido O.,

Tive vontade de escrever outra carta. Há tempos a poesia andou sumida daqui de dentro. Como as lágrimas. Mas então um dia fui pega de surpresa e pude deixá-las sair sem peso. Assim, tranquilamente, até ficar de cabeça doída. O que será que as lágrimas fazem lá dentro que deixam a cabeça assim doída quando saem? Devem ser mesmo muito queridas. Será que elas mexem, balançam rios, alimentam piscinas? Será que elas têm cores? E então eu vivo assim, esperando ser pega de surpresa. Sabe, querido, eu percebi que a gente vive mesmo assim, sendo surpreendido. Não é tão difícil. Difícil mesmo é nascer, crescer, reproduzir e morrer. Como alguém consegue ser assim? E querer ter filhos pra encher de mimos. E fotos. Eu ainda prefiro as surpresas. Mas onde mesmo a poesia foi parar? Antigamente, vinha junto com as lágrimas. Dessa vez só a dor. De cabeça. ‘Ainda há tempo’, elas me dizem, lá de dentro. Lágrimas às vezes falam. Mas são mimadas, é só quando querem. Sabe, eu queria que elas dissessem: ‘vai dar certo, vai dar tudo certo’. Mas então você me disse. E eu senti seu abraço. E sorri.

Li.